segunda-feira, 2 de outubro de 2017

Bíblia, Profetas e a Opção Pelos Pobres

Por Marcos Aurélio dos Santos 

A prática do amor e da justiça devem estar nas entranhas dos seguidores de Jesus de Nazaré. Aliás, a justiça não está desvinculada da espiritualidade cristã, não há dicotomia. É a consciência de justiça do reino que nos move ao encontro do pobre, dos excluídos, dos explorados e marginalizados da sociedade. A justiça de Deus ao oprimido encontra robusta base bíblica. Está registrada nos relatos históricos da bíblia, na vida, nas ações e nas falas subversivas dos profetas hebraicos. Os profetas da bíblia fizeram opção pelos pobres a partir do senso de justiça divina, sob orientação do Deus dos oprimidos e excluídos.

Seria necessários milhares de linhas para descrever a opção dos profetas pelos pobres. Neste artigo não caberá tantos relatos. É importante saber que a opção pelos pobres vai muito além do dar pão. Ela aponta para uma dimensão mais alargada e profunda. Para os profetas e profetizas da bíblia, a pobreza, fome e miséria que permeavam a região onde habitavam era causada pela opressão dos poderosos que concentravam suas riquezas em detrimento da pobreza de muitos.
O profeta Amós em sua denúncia contra os poderes dominantes de sua época profetizou:

“Portanto, visto que pisais o pobre e dele exigis um tributo de trigo, edificastes casas de pedras lavradas, mas nelas não habitareis; vinhas desejáveis plantastes, mas não bebereis do seu vinho.
Porque sei que são muitas as vossas transgressões e graves os vossos pecados; afligis o justo, tomais resgate, e rejeitais os necessitados na porta” (Amós 5:11,12).

A opressão contra o pobre, o justo, o necessitado tinha uma fonte. As pisadas esmagadoras contra os pobres partiam dos ricos, dos que possuíam e acumulavam bens. Como descreve o profeta, gente que habitava em residência de luxo feita com “pedras lavradas”, cercada de belas e robustas plantações de vinhas. Na linguagem do profeta Amós, pisar o pobre significava cobrar-lhe impostos abusivos, exclui-los da participação dos lucros e forçá-los a trabalhar de sol a sol por míseros salários. Essas ações de opressão dos ricos tinha um objetivo. Deixá-los em sua pobreza sem direito a nenhum acesso às fortunas acumuladas a preço de usurpação dos direitos dos pobres. Uma riqueza que gerava pobreza.

Dentre milhares de textos da bíblia que falam sobre pobreza e justiça, este do profeta Jeremias merece uma reflexão-ação.  

“Ele defendeu a causa do pobre e do necessitado, e, assim, tudo corria bem. Não é isso que significa conhecer-me? ”, “declara o Senhor”. (Jeremias 22:16).
Há uma relevante afirmação do próprio Deus por meio do profeta nesta passagem que aponta para uma espiritualidade que inclui o pobre. Ele afirma: ” Não é isso que significa conhecer-me? ”, “declara o Senhor”. Fica bastante claro que conhecer a Deus para uma relação de amor não se pode descartar o pobre, isto porque a opção pelos pobres não é uma ideia filosófica ou uma doutrina. É uma espiritualidade em Deus, que encontra Deus no rosto dos pobres e oprimidos a partir de uma caminhada na prática.  

Então, esse conhecimento de Deus não é teológico-científico-doutrinal, não é para explicar Deus, mas é uma espiritualidade humanizadora, que nos faz ser gente que ama, que gosta de gente, que nos leva ao encontro do pobre e ao mesmo tempo com Deus. Essa espiritualidade rompe a bolha individualista do egoísmo e transcende para outra espiritualidade que é comunitária, fraterna e misericordiosa, que inclui a todos e todas. Lutar ao lado dos pobres por seus direitos é abrir a cortina do divino para conhecer o Deus de amor e justiça. 

Essa espiritualidade descrita pelo profeta Jeremias não é dicotômica ou reducionista, ela é integral e libertadora, que denuncia dota a injustiça em todas as dimensões da vida humana, principalmente contra os pobres.
Em nossa prática de justiça do reino, ainda estamos nos limites do dar pão. De fato, dar comida a quem tem fome, remédios a que está
doente, abrigo a quem está sem teto e outras ações de socorro são necessários em casos emergenciais. 

Mas limitar-se a isso é um erro. Ações de filantropia o capitalismo o faz também, ainda que sem sentimentos, pois o capitalismo quer retorno lucrativo em tudo que faz. Fazem também os religiosos, muitas das vezes para se destacar entre os demais como os benfeitores das boas obras aos pobres. Na espiritualidade cristã se faz urgente e necessário o resgate da profecia, denunciar todo tipo de riqueza que gera opressão e pobreza, acreditar no empoderamento dos pobres para que sejam sujeitos de sua própria libertação.          
    


       

terça-feira, 29 de agosto de 2017

A Revolução Será Feminina, Preta e Pentecostal: Ariovaldo Ramos



O prefeito da cidade dos bandeirantes, cuja política educacional permite que crianças sejam marcadas para não repetir a merenda escolar, merenda, cujo volume, outrora suficiente para uma semana, agora, é o disponibilizado para o mês todo, viaja às custas de sua pífia administração, saudado por ovos, como seu congênere, numa indisfarçável campanha para presidente de republiqueta.

Mas, por outro lado, contra todos os detratores e agentes da repressão à vontade popular e à democracia, inclusive togados, o ex-presidente da República Federativa do Brasil, Luís Inácio Lula da Silva, é ovacionado em sua caravana pelo nordeste, deixando claro que sua candidatura, além de ser anti-ditadura, como foi a de Ulisses Guimarães, é exigência da democracia  golpeada.

Graças ao fatídico, ofensivo e abusivo “mandato coletivo” supostos agentes da segurança pública são acusados de adentrar casas de trabalhadores, na cidade maravilhosa, e, simplesmente, consumir iogurtes e que tais, certamente, com sacrifício, adquiridos por pais ciosos em satisfazer o legítimo desejo de suas crianças.

Apesar disso, vídeo amador flagra mulheres pretas, em uma das comunidades cariocas aviltadas, resistindo ao desrespeito dessas forças, tidas como de segurança pública, ao som de hineto evangélico que ressalta o valor que Cristo reconhece e confere ao ser humano, levando alguém a sugerir que a revolução será feminina, preta e pentecostal.

A brava gente brasileira começa a reagir!



Basta de guerra! Queremos vida, vida com abundância



Por Henrique Vieira


Nós somos discípulos de Jesus Cristo de Nazaré. Preso, torturado, brutalmente assassinado, aliás, a morte mais violenta da época, operada pelo próprio estado, um rito longo de tortura, de imposição, de dor e sofrimento ao corpo como forma de punição e exemplo para os outros.

Nós não podemos esquecer a nossa origem. Aquele a quem nós chamamos de Senhor, Filho de Deus e Deus entre nós, teve o seu corpo capturado pela ordem, massacrado, hostilizado, humilhado e torturado pelo aparato legal do seu tempo.


O que a gente está vivendo no Brasil, é a violência permanente do estado, especialmente contra a população preta, o que está acontecendo em várias cidades do Rio de Janeiro e em todo o país. Um genocídio, um assassinato permanente. Uma parcela de nossa juventude e da nossa infância sendo perdida por uma lógica de guerra, uma tal criminalização das drogas, que na verdade é máquina de moer gente, é máquina de matar pobre, é máquina de roubar sonhos, juventude, infância e adolescência.  


As igrejas não podem fechar os olhos para isso. O silencio, a apatia, a indiferença, uma devoção que não se comove com essa realidade cotidiana. Deus pede para nós uma resposta, um grito contra essa lógica, uma afirmação de que, quem é discípulo de um torturado e assassinado, tem que doar a vida por uma paz verdadeira.


A paz verdadeira não vem da brutalidade policial, a paz verdadeira não vem de um estado que prende e mata, a paz verdadeira não vem do camburão, da tropa de choque, da militarização, dos espaços da lógica do extermínio, do confronto. Não! Essa lógica das armas que apenas mantém e administra a desigualdade é incapaz de produzir a paz profetizada e encarnada por Jesus Cristo de Nazaré, aliás, foi esse tipo de lógica que prendeu, torturou e matou Jesus Cristo.


Portanto um convite, uma convocação para que as igrejas denunciem a violência do próprio estado, para que em nome de Jesus, com a Bíblia na mão, com os joelhos no chão, em ato de adoração possam se colocar em defesa da infância e da adolescência contra essa lógica de guerra, porque a gente vai continuar perdendo mais jovens, mais crianças em nome desse combate que gera apenas mais morte.


É em nome de Jesus e pela verdadeira paz, que as igrejas precisam se posicionar contra a brutalidade do estado que mata nossa população jovem, de infância, pobre, preta, favelada e da periferia. Não contará com nosso silêncio.



Texto transcrito do vídeo publicado pelo movimento Esperançar

segunda-feira, 28 de agosto de 2017

O Espírito Santo, "Pai dos Pobres," Presente na Luta dos Oprimidos



 O Espírito Santo foi enviado, como o Filho, ao mundo para completar e prolongar a obra de redenção e libertação integral. Seu campo privilegiado de ação é a história. Qual vendaval (Espírito em sentido bíblico) está presente em tudo que implica movimento, transformação e crescimento. Não conhece compartimentos, estanques e sopra onde quer, dentro e fora do espaço cristão. Toma as pessoas, enche-as de entusiasmo, confere-lhes especiais carismas e aptidões para transformarem a religião e a sociedade, romperem as instituições enrijecidas e criarem coisas novas. O Espírito preside a experiência religiosa dos povos não permitindo que jamais olvidem a perspectiva de eternidade e sucumbam aos apelos da carne.


De modo todo especial se faz atuante na luta e resistências dos pobres. Não é sem razão que vem denominado pela liturgia como o “pai dos pobres”, dando-lhes coragem para enfrentarem dia a dia a árdua peleja pela sobrevivência de si e de suas famílias, encontrando forças para suportarem as opressões do sistema socioeconômico que os explora e que não podem mudar de um dia para o outro, mantendo viva a esperança de que sempre se pode melhorar algo e que, unidos, poderão historicamente se libertar. A piedade, o senso de Deus, a solidariedade, a hospitalidade, a fortaleza, a sabedoria da vida, urdida de sofrimento e de experiência, o amor aos filhos próprios e dos outros, a capacidade de celebrar e de se alegar dentro dos piores conflitos, a serenidade com que enfrentam a dureza da luta, da vida, a percepção de que é possível e viável, a moderação do uso da força, e a resistência quase ilimitada de suportar a agressão persistente e diuturna do sistema econômico  com a marginalização que provoca, tudo isso são dons do Espírito, vale dizer, formas de sua inefável presença e atuação no seio dos oprimidos.


Mas essa atuação é ainda mais clara quando se insurgem, decidem tomar a história em suas mãos, organizam-se para reinventar e transformar e sonham no sono e na vigília com uma sociedade onde haja lugar para todos com pão e dignidade. A história das lutas libertárias dos oprimidos é a história da chama do Espírito Santo no coração dividido deste mundo. Por causa do Espírito, jamais morrerem e nunca adormecerão, sob a cinza da resignação, os ideais de igualdade e de fraternidade, a utopia de um mundo onde seja mais fácil amar e reconhecer no rosto do outro os traços maternos e paternos de Deus.

É também à luz da ação do Espírito que se deve entendera emergência da igreja nas bases, feitas mais acontecimentos que instituição, atualizando o movimento de Jesus e se comprometendo com a justiça do Reino. É aqui que se mostra a igreja como sacramento do Espírito Santo, dotada de muitos carismas, ministérios e serviços para o bem de todos e a construção do Reino na história.



Texto extraído do livro Como Fazer Teologia da Libertação: Leonardo Boff e Clodovis Boff.





  



  
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